Desde o 1º dia de
setembro, a república do Azerbaijão, conhecida também com a Terra do Fogo, e sua capital Bakú, A Cidade dos Ventos, se vestem de gala para dar as boas vindas à
maior festa do mundo enxadrístico. A 42ª Olimpíada recebeu aos 1600
desportistas participantes, representantes de 180 nações, entre eles o Brasil,
com participação na principal competição por equipes, divididas em categorias,
Absoluto (homens e mulheres) e Feminino.
Esta espécie de
Mundial de selecionados reúne aos melhores enxadristas de cada país, que
disputarão esta prova pelo sistema suíço em 11 rodadas e que se estenderá até o
dia 13 deste mês.
Na última
Olimpíada de Xadrez disputada em Tromso (Noruega), em 2014, os mestres
brasileiros finalizaram em 22º - entre 177 equipes, e a China ganhou a medalha
de ouro na prova Absoluta. Já a categoria feminina ficou em 44º - entre 140
equipes – e a vitória coube à Russia.
XEQUE À XENOFOBIA, COM MATIZES
Mulheres com
véu e cobertas até o tornozelo a um lado da mesa; decotes de um lado ou rastas
no outro. Negros, brancos, asiáticos, jovens, anciãos, cegos, surdos,
deficientes e pessoas de todas as religiões, se misturam a cada dia em hotéis e
ônibus, para se enfrentarem e desfrutar na Olimpíada de Xadrez. É raríssimo que
haja problemas de xenofobia, exceto quando os países árabes se negam a jogar
contra Israel.
Os participantes
podem ser divididos em dois grupos: uma pequena percentagem de quem luta por
medalhas ou postos, que vivem como desportistas de elite, e se misturam pouco;
e todos os demais, que desfrutam ao máximo, e com a maior mistura possível,
esta é a festa bienal de 14 dias. Há dois anos, na Olimpíada de Tromso
(Noruega), o jamaicano Ian Wilkinson subiu num ônibus que o levava para a sala
de jogo e começou a cantar One Love,
de Bob Marley. “Poucos segundos depois todos cantavam comigo: africanos,
europeus, asiáticos, latinos... Foi muito emocionante”, recorda.
Ao contrário
dos Jogos Olímpicos, onde quase todos os esportes tem uma sede distinta e
afastada, a Olimpíada de Xadrez junta a todos no mesmo recinto cada dia.
Rússia, China e Estados Unidos são os principais aspirantes ao pódio na
competição absoluta; China, Rússia, Georgia e Ucrânia na feminina. Esses jogadores
competem em uma zona com cordões e vivem com uma rígida disciplina, sem tempo
mal para se aproximar no outro extremo da enorme sala, onde está o espetáculo
multicultural, com emparceiramentos: Ilhas Virgens – Nepal, Aruba – Arábia Saudita,
Siri Lanka – Haití, Hong-Kong – Palau, Sudão do Sul – Omãn, Fiji – Guiana, São
Marino – Guam ou a equipe da Associação de Cegos (IBCA) frente a Zâmbia, com
tabuleiros e relógios especiais. O jornal espanhol El Pais consultou dez
enxadristas que estiveram em mais de cinco olimpíadas como capitães, árbitros
ou jogadores; ninguém recorda um incidente por xenofobia ou racismo, e todos
falam o contrário: “o ambiente de convivência fantástica é consubstancial às
Olímpiadas, tanto na sala de jogo, como nos hotéis”. Afirma o presidente da
Federação de Andorra.
Costuma haver
exceções temporárias no caso de guerras ou similares. Por exemplo, Armênia não
está em Baku porque seus jogadores temiam pela segurança deles, devido aos
mortos e feridos que segue causando o conflito de Nagorno-Karabaj (enclave
armênio rodeado pelo Azerbaijão). Os
árbitros costumam modificar discretamente os emparceiramentos nesses casos,
porém não o reconhecem oficialmente. Por exemplo, é muito improvável que Sérvia
e Kôsovo se enfrentem.
A única exceção
permanente é a atitude de quase todos os países árabes, que se negam a jogar
contra Israel, porém não somente nas Olimpíadas, mas, inclusive, no Mundial
sub-10, ainda que estes meninos joguem futebol juntos pela manhã. “É que se
permito que meus garotos joguem contra um israelense, o castigo na volta será
duríssimo”, explicam os delegados. São ordens de seus governos, que rompem com
o lema da Federação Internacional: Gens uma
sumus (somos uma família).